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Superação | A vida de uma tetraplégica que decidiu reescrever a própria história
**Especial para a revista Total Saúde
Link: http://www.revistatotalsaude.com.br/revistas/edicao-fevereiro-2013
Se a vida fosse transcrita num papel, como em uma história, cada momento seria marcado com uma pontuação. Assim, os dias de dúvidas e indecisões seriam representados por pontos de interrogação; surpresas e frustrações do cotidiano ocupariam as exclamações; já o ponto final seria o momento mais adiado…
Mas na história da vida são as vírgulas as grandes responsáveis pelas maiores mudanças de roteiro.
Acostumada a lidar com textos, a jornalista Ana Paula Cardoso decidiu reescrever a própria história após sofrer um acidente de trânsito que a deixou tetraplégica.
Há quatro anos, uma lesão medular paralisou não somente os movimentos dos membros, mas também muitos sonhos, projetos, deixando um edema de incerteza e angústia. Na época, com 24 anos, a jornalista recebia a pior notícia de sua vida: estaria destinada a ficar na cadeira de rodas.
O diagnóstico trágico ultrapassou as fronteiras da paciente, atingindo familiares e amigos num misto de dor e medo. A medicina se rendia ao inevitável. Cenário este que, infelizmente, se repete – talvez diariamente – em todo o Brasil.
Não há como não se sensibilizar ao ler, ver ou acompanhar uma história como esta sem lançar mão da empatia. No entanto, Ana Paula decidiu mudar o rumo da própria história e, no lugar do ponto final, colocou uma vírgula.
Nesse momento, o que parecia ser o fim foi substituído por um longo e profundo respiro. A dor se transformou em esperança, e do medo brotou força. Na cadeira de rodas, Ana Paula se apoderou do fôlego de vida e decidiu continuar. Em vez de aceitar, ela optou por se adaptar à nova vida, e para enfrentar as limitações, apoiou-se em dois pilares: família e fé.
“São muitos os desafios a serem enfrentados. Primeiramente, você precisa superar o choque. No começo, você não percebe a paralisia. Depois, lida com o alívio de estar vivo e com a frustração de depender dos outros para fazer coisas simples, como pentear o cabelo ou escovar os dentes, por exemplo.
Diante desse quadro, temos duas opções: ou a gente para e desiste ou continua. E pra continuar é preciso se olhar no espelho e superar o preconceito contra si mesmo”, resume Ana Paula, com uma lição de superação.
A decisão de continuar é apenas o início de um processo que exige do cadeirante novos níveis de conhecimento sobre o próprio corpo. “Você reaprende a viver com a recuperação da sensibilidade, dos movimentos, da força…
Aprende a lidar de outra forma com a bexiga, com o intestino e ainda convive com uma série de complicações que surgem, como escaras, alteração da pressão arterial, problemas de circulação, respiração, enfim”.
Hoje, com 29 anos, Ana Paula superou o período mais crítico depois do trauma: os dois primeiros anos após o choque medular, período fundamental para a recuperação da sensibilidade e dos movimentos.
Ela mantém uma rotina puxada de fisioterapia, voltou a exercer sua profissão e virou referência com o blog (www.sigorodando.blogspot.com.br), em que compartilha, com tetra e paraplégicos de todo o Brasil, suas experiências pessoais, dá conselhos e abre seu coração. “Não aguento paraplégicos reclamando… Dá vontade de falar: quer trocar comigo?”, desabafa a jornalista, sem perder o humor.
No espaço virtual, Ana Paula também publica informações sobre pesquisas e tratamentos na área da reabilitação e faz denúncias de práticas abusivas contra os cadeirantes. “É inadmissível, hoje, ainda existir pessoas que estacionam nas vagas reservadas a cadeirantes. Se você não é cadeirante, não demonstre que deseja ser um”, alfineta.
Já para quem convive com treta e paraplégicos, Ana recomenda: “não queremos ser tratados como coitados. Não julgue, não tenha pré-conceitos. Busque ajudar, e comece perguntando como, procure facilitar”.